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A cidade do Sol realmente brilha?

  • Foto do escritor: Joseb S. Roque
    Joseb S. Roque
  • 6 de jan. de 2021
  • 6 min de leitura

Atualizado: 9 de mar.



Autor: Joseb Silva Roque*


1 - INTRODUÇÃO


Este artigo tem como objetivo analisar de forma crítica a obra A Cidade do Sol de Tommaso Campanella, que nasceu em 05 de setembro de 1568. O livro foi escrito em 1602 durante sua prisão em Nápoles, que durou 27 anos, ele foi preso pela Inquisição Espanhola. A narrativa parte a partir da conversa entre o Grão-Mestre dos Hospitalários e um Almirante genovês que conta sobre sua última viagem e o encontro com a Cidade do Sol.


2 - A CIDADE DO SOL


A cidade aparece do alto de um morro em um vasto campo, é formada por círculos e vai para além dos perímetros do campo e do morro com cerca de 2 milhas de diâmetro (5,17 Km²). Com sete círculos que recebem o nome dos sete planetas formando a sua estrutura e cada um interligado com os outros através de quatro portões localizados segundo os pontos cardeais.


Visualmente imponente e fortemente protegida por seus muros e defesas militares reforçadas a Cidade do Sol em seu interior se apresenta como um museu vivo do mundo. Lá pode se encontrar todas as espécies de animais grande e pequenos além de plantas. Nos seus muros e templos se encontram os principais heróis, líderes, estrategistas, pensadores, cientistas e religiosos da humanidade, sendo Jesus Cristo e os seus doze apóstolos os mais venerados.


Seus muros também servem como uma espécie de biblioteca a céu aberto, onde as mais deferentes ciências conhecidas pela humanidade se encontram amostra. O sistema de educação se mostra peculiar, pois as crianças aprendem todas as ciências se divertindo e antes dos dez anos de idade, após os três aprendem o alfabeto e a língua.


São escolhidos para o magistrado segundo a vocação que cada um demonstra desde criança no seu aprendizado. O mais velhos cuidam dos mais novos e todos se respeitam segundo sua idade. Os jovens se chama a todos de irmãos, os com 15 anos ou mais são chamados de pais e os com 15 ou menos são chamados de filhos.


A organização social se dar com um Príncipe Sacerdote chamado de Hoh, que quer dizer Sol, ajudando a governar a Cidade do Sol ele conta com mais três Príncipes; Pon (Poder), que cuida das guerras, artes militares e paz, Sin (Sabedoria), é responsável por todas as ciências conhecidas e detém um livro com todas elas. Mor (Amor), que é responsável pelo sentir, viver algo que representa o amor universal.


Seus líderes são escolhidos de acordo com a sua sabedoria. O cargo de Hoh é vitalício e só se pode assumir essa posição após os 35 anos de idade. Para se tornar o Sol é preciso ser sábio em todas as coisas, assim os moradores acreditam ser a forma mais justa de escolher um governante.


A todos nada falta de lazer a comer, porém tudo é dado segundo o magistrados acham justo. Casa, casamento e filhos são propriedades da Cidade do Sol, tudo que nela está incluindo os moradores servem para mantê-la, guardar sua tradição e protejer a unidade da sociedade. Aqui não há crimes como no mundo conhecido, nada de assassinatos, roubos, incestos entre outros.


Quando denunciados por crimes, esses geralmente são calúnias, ingratidão, maldade e mentira. Tudo que possa desorganizar a estabilidade social da Cidade. Não há prisões, exceto uma torre para os inimigos da Cidade. Não existe carrascos para realizarem a pena capital.


Para mulheres pintar os rostos e usar calçados altos (Destacar a sensualidade). Para penas mais brandas o afastamento social e por exemplo de não ir para igreja ou falar com mulheres são opções usadas. Também são adeptos a tortura onde dizem que após 40h se um homem não falar nem as estrelas podem fazer ele falar.


Aqui homens e mulheres são criados para guerra, suas vestimentas se diferenciam basicamente pela túnica feminina ser abaixo dos joelhos e dos homens acima. O povo da Cidade do Sol exalta os guerreiros e seus triunfos, também odeia os déspotas e tiranos que circundam o mundo, vivem em paz, contudo sempre estão preparados para a guerra.


3 - O SOL REALMENTE BRILHA?


Convido agora a uma reflexão mais aprofundada sobre a breve descrição acima da cidade “perfeita”. Geograficamente a cidade é mostrada como aparecendo do alto de um morro, isso mostra a grandeza dela em detrimento daquele que a observa, ou seja, a grandeza da cidade e seu povo em relação aos estrangeiros que podem ser vistos como inferiores.


A educação se comparada a nossa é de fato utópica, aprender todas as ciências antes de dez anos de idade, meninos e meninas em pé de igualdade social, foco de ensino a partir das aptidões demonstradas entre outros pontos. Porém, as crianças são propriedades da cidade, são um componente social, uma ferramenta de manutenção sem vínculos familiares.


Todos adoram o Hoh e seus príncipes e magistrados devido a suas habilidades intelectuais, entretanto não se pode escolher onde trabalhar, com o quê trabalhar e nem se recebe remuneração. Nada falta a nenhum cidadão, mas também nada se tem e nem se escolhe, esse dever cabe aos Príncipes e magistrados não ao povo.


Não há crimes violentos e cruéis como conhecemos e tememos, porém existe pena capital para sensualidade por exemplo. Mentiras, má vontade e até ingratidão são crimes contra a virtude e a sociedade, que podem levar a exclusão social e religiosa. Embora não haja carrascos a morte é dada de maneira brutal por combate com feras por exemplo e o resto do cadáver vai para estudos anatômicos. Além de ser legalizada a tortura, tudo para o bem maior da Cidade do Sol.


Thomas Hobbes em seu livro O Leviathan trás uma luz para essa análise. Em seu livro ele discursa sobre a necessidade de abrir mão de certos direitos e liberdades para que o Líder e o Estado possam funcionar, assim sendo, ao abdicar de direitos e liberdades o Estado recompensaria a população com segurança e estabilidade social. O que segundo Hobbes seria visto como uma troca justa, pois o cidadão não precisava se preocupar com certas burocracias sociais.


Olhando para teoria psicanalítica achamos em Totem e Tabu e Moisés e o Monoteísmo uma organização social totêmica, onde os sujeitos se agrupam em torno de um totem paterno, de uma figura que representa neles os seus ideias personificados. Erigimos a figura de um deus, ou de um forte líder humano uma projeção simbólica dos nossos desejos de ser e ter. Escolhemos essas figuras para representar o nosso íntimo e se eximir de nossas responsabilidades, seja pela lei, seja passividade social.


4 - CONCLUSÃO


Por fim, partindo destas teorias podemos observar que uma cidade utópica existe em parte, pois para isso os seus integrantes devem perder o amor próprio e venerar o estado, abrir mão da liberdade de escolha e amor em favor da governança do Líder e seu Estado. Deixar de ser filho(a), pai, mãe, esposa, marido e ser apenas um componente em troca de nada faltar a não ser a liberdade.


A cidade perfeita o sol até brilha, mas não para todos! Como em todas as outras…


  • Bacharel em Psicologia pela Uninassau-JP, Pós graduado em Projeto e Desenvolvimento de Jogos Digitais pela Universidade Cruzeiro do Sul, Pós graduado em Psicanálise, Docência e Pesquisa para Área da Saúde, Docência do Ensino Superior e Tutoria em Educação à Distância pela Faculdade Dynamus de Campinas, Técnico de Enfermagem pela Escola Técnica de Enfermagem Rosa Mística, Palestrante e Escritor.

  • E-mail: josebroque@icloud.com

  • A reprodução parcial ou total desta produção sem autorização prévia ou créditos é expressamente proibida.


REFERÊNCIAS


CAMPANELLA, T. A Cidade do Sol. Petropólis: Vozes, 2014.


FREUD, S. Obras completas, volume 19: Moisés e o monoteísmo, Compêndio de psicanálise e outros textos (1937-1939). São Paulo: Companhia das Letras, 2018.


FREUD, S. Obras completas, volume 11: Totem e Tabu, contribuição à história do movimento psicanalítico e outros textos (1912-1914). São Paulo: Companhia das Letras, 2012.


HOBBES, T. Leviatã: Ou A Matéria, Forma E Poder De Uma República Eclesiástica E Civil. São Paulo: Martins Fontes, 2019.

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